O direito socorre aos que não dormem - A famosa Lei do Silêncio
Embora a Organização Mundial de Saúde (OMS) defenda que o barulho não deva superar 55 decibéis (db), sob risco de causar prejuízos à saúde humana, os habitantes de capitais como São Paulo, Brasília e Rio de Janeiro experimentam limites muito superiores.
Além de prejudicar o sistema auditivo, som em volume excessivo provoca alterações comportamentais e orgânicas (distúrbios do sono; estresse; surdez; dores de cabeça; falta de concentração; aumento do batimento cardíaco; etc.).
Em resposta aos incômodos sonoros, informalmente, fala-se numa “Lei do Silêncio” que imporia limites ao barulho após às 22 horas.
O que não é totalmente correto, pois não há propriamente uma única lei que regule nacionalmente a questão do barulho. Não existe UMA “Lei do Silêncio”, mas várias normas de âmbito nacional e local sobre a matéria.
Há Lei do Silêncio?
Pode se dizer que as Leis do Silêncio são as normas municipais que fixam os limites aceitáveis de barulho, em decibéis, segundo a destinação da zona municipal. Os municípios – responsáveis pelo ordenamento territorial, uso e controle do solo urbano – editam normas para organizar a cidade e autorizam maior ou menor quantidade de ruídos a depender do local (áreas industriais, comerciais, residenciais e mistas).
Contudo, além das Leis do Silêncio incidem outros dispositivos legais a fim de tutelar o sossego – direito da personalidade que se relaciona ao direito à saúde, à paz, ao meio ambiente equilibrado, ou seja, à dignidade do ser humano[1].
Mesmo se admitida certa quantidade de ruídos, o barulho excessivo que comprometa a paz e saúde da pessoa pode e deve ser afastado. Inclusive, o STJ entende que, como o meio ambiente tutela não só a fauna e a flora, mas também a vida humana, se a emissão de som superar os padrões estabelecidos, provocando degradação ambiental que resulte ou possa resultar em danos à saúde humana, há crime ambiental [2]. Nesse caso o Ministério Público é competente para propor ação penal por crime ambiental.
Além de responder por crime ambiental, quem causar poluição sonora, ao afetar uma coletividade e comprometer o meio ambiente, poderá ser condenado em danos morais coletivos e terá que pagar um valor como reparação aos afetados[3].
Ou seja, o direito à tranquilidade – decorrência do princípio da dignidade humana e do direito ao meio ambiente equilibrado – impõe limites a bailes, algazarras, animais e vibrações intensas que prejudiquem física e psicologicamente a pessoa, mesmo antes das 22 horas.
Por isso, além das normas municipais, o Código Civil, leis ambientais e penais admitem a responsabilização pelo barulho excessivo.
Barulho dos vizinhos
Enquanto as normas municipais impõe uma obrigação perante o Poder Público, o Código Civil reconhece direitos entre particulares. Um morador pode fazer cessar interferências ao seu sossego e saúde que resultem da má utilização de propriedade vizinha, inclusive de barulho, conforme o art. 1.277 do Código Civil.
Como o Código Civil não autoriza horário para se fazer barulho, em caso de excesso, os prejudicados têm direito de interromper a pertubação mesmo que ela ocorra durante o dia. A pessoa que produz excesso de ruídos, independentemente do horário, comete um ato ilícito, pois faz mau uso da sua propriedade, descumprindo a sua função social [4].
Uma vez que esse ato ilícito causa dano àqueles que sofreram a pertubação, há direito de compensação por dano moral. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro -TJRJ costuma fixar compensações de até R$ 10.000,00 (dez mil reais) [5], em casos extremos o STJ já deferiu de até R$ 40.000,00 (quarenta mil reais).
Barulho de Carro de som
O art. 228 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), regulado pelo art. 1º da Res. nº 624/2016 do CONTRAN, considera infração de trânsito grave o uso de equipamentos de som em veículos de qualquer espécie, que produza som audível pelo lado externo, independentemente do volume ou freqüência, que perturbe o sossego público, nas vias terrestres abertas à circulação.
Não suficiente, na cidade do Rio de Janeiro, o art. 13 da Lei Municipal nº 3.268/2001 considera ilegal a publicidade por carros de som, independente de horário ou volume.
Art. 13 da Lei do Município do Rio de Janeiro nº 3.268/2001 - Ficam proibidos, independentemente dos níveis emitidos, os ruídos e/ou sons que provenham de: I - pregões, anúncios ou propagandas no logradouro público, ou para ele dirigidos, de viva voz, por meio de aparelhos ou instrumentos de qualquer natureza, de fontes fixas ou móveis; (grifei)
Excepcionalmente, os carros de som podem funcionar nas eleições. Contudo, a lei eleitoral (Lei nº 9.504/97), restringe os carros de som a carreatas, caminhadas, passeatas e durante reuniões e comícios, e somente entre 8h-22h.
Barulho de Boates, Festas, Bares e Restaurantes
A legislação admite que bares e restaurantes emitam um certo grau de ruído durante o dia, devendo ser reduzido à noite (22h -7h). Em áreas residenciais esse limite é menor, já em localidades comerciais há maior liberdade de produzir ruídos, conforme o respectivo zoneamento urbano municipal.
Entretanto, se os ruídos emitidos estiverem acima dos níveis máximos permitidos, fica configurada a poluição sonora do meio ambiente, e tanto a pessoa jurídica como os gerentes estarão sujeitos à responsabilização, inclusive criminal.
Havendo excesso, constatado por laudo da Secretaria Municipal do Meio Ambiente, os moradores de imóveis contíguos também podem requerer que o estabelecimento promova o tratamento acústico do estabelecimento e reparação por danos morais e materiais.
Como proceder?
É recomendável que as vítimas do barulho se reúnam e tentem resolver o problema de forma amigável pedindo para que a pertubação pare.
Se o infrator não ceder ao diálogo, o IBAMA aconselha uma denuncia ao órgão municipal competente. Havendo omissão municipal, caberá então ao órgão estadual a fiscalização.
Não havendo uma solução satisfatória, recomenda-se a gravação da pertubação em vídeo e áudio, demonstrando a data e horário que ocorreu e por quanto tempo durou. Os vídeos poderão ser apresentados ao Ministério Público e/ou a um advogado qualificado. O importante é que os direitos de todos sejam respeitados. Havendo dúvidas, é sempre bom consultar um advogado de confiança.
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